30 dezembro 2008

Igreja e Culto – Parte 8


A questão da Catolicidade da Igreja

Ao final do primeiro século, o que falta ao Cristianismo para chegar à unidade e à coesão? Fundir suas unidades em uma Igreja. A idéia Católica ainda não nasceu, embora a comunhão em Cristo e a fraternidade dos fiéis estabeleceram entre eles vínculos evidentemente compreendidos sob esta denominação: a Igreja. Os partidários da primazia de Pedro, dispostos a admitir que ele foi o primeiro papa de Roma e que depois dele uma série ininterrupta de pontífices se têm sucedido em seu trono, sustentam que desde os tempos de Clemente a soberania da Santa Sé estava admitida na cristandade (...) Fixam-se também na Epístola aos Coríntios, atribuída a Clemente, e que teria sido escrita por ele na qualidade de papa e como uma advertência papal. É preciso ver nela, entretanto, um conselho fraternal, uma exortação à paz. O tom da carta não é de modo algum autoritário. Ademais, o anonimato que guarda o autor, como também a ausência de uma fórmula capaz de justificar as pretensões que se lhe atribuem, provam que não as têm. (...) Ainda têm tirado da Epístola de Inácio aos romanos expressões que, somente falseadas parecem confirmar a tese da supremacia da Igreja romana: “Ela preside no lugar do país dos romanos” e “é presidente da caridade”. Essas fórmulas vagas e obscuras não contêm outra coisa senão uma alusão à importância da Igreja, localizada na capital do Império, e um elogio de seu espírito de amor. As outras cartas de Inácio têm fórmulas análogas e nada se pode deduzir disto. No “Pastor”, de Hermas, livro de meados do século II, e provavelmente de origem romana, a Igreja não é mais que a Sociedade dos cristãos, simbolizada por uma torre que o “Pastor”, anjo da penitência, edifica com as pedras que representam os fiéis. Sua organização não está regulamentada e não se faz menção alguma da primazia de Pedro, embora o “Cânon de Muratori” atribua a composição do “Pastor” ao próximo irmão do bispo romano Pio I.

Além do que, era impossível conceber a unidade católica antes que cada comunidade fosse provida de um clero uniformemente constituído. (...) Ao final do século I, a cristandade marcha, entretanto, para a formação desta idéia católica, justamente porque tende a abandonar a direção de suas comunidades a um clero que trabalhará com ardor para constituir a unidade do dogma e da disciplina.

Em princípio, a Eclésia, a assembléia dos fiéis, permanece soberana; algumas alterações, entretanto, vão se processar:

1 – Diminuição da autoridade dos inspirados e tendência a reduzir, na vida comum da Igreja, a importância dos carismas.

2 – Desconfiança em relação aos didáscalas, ou profetas ambulantes, para favorecer os funcionários locais.

3 – Atribuição de funções cada vez mais particulares aos presbíteros, com exclusão do simples fiel; assim, acontece com a unção do azeite aos enfermos de que fala a Epístola de Tiago. Ao mesmo tempo, afirmação da idéia de que eles têm direito de ser obedecidos nos limites de suas funções, porque têm a responsabilidade das almas que dirigem (Epístolas aos Hebreus).

4 – Concessão aos funcionários encarregados da parte material da administração da Igreja (bispos e diáconos) de atribuições religiosas, em caso de necessidade, e, sobretudo de um ministério litúrgico, proibido aos leigos (I Coríntios, de Clemente de Roma) que começa a acontecer.

5 – Tendência a confundir nas mesmas pessoas as funções de instrução, de edificação e as funções administrativas; isto é,a tendência a dividir a assembléia cristã em duas partes cada vez mais distintas: os clérigos e os leigos, reduzidos estes últimos ao papel de assistentes.

6 – Marcha para o episcopado monárquico.

*Charles Guignebert, Manual de História Antigua del Cristianismo. Buenos Aires, Albatros, 1973. pp. 404-410.

(Esta foi a última parte deste estudo sobre o desenvolvimento litúrgico e a organização formal da igreja ["Igreja e Culto"]. No mês de Janeiro, estaremos abordando o tema ["Igreja e Política"] histórico da relação da igreja com o estado.)
Desejo à todos um "Feliz 2009" e que O grande El Shaday abençõe todos nós. Amém!
Em Cristo,
Eduardo Neves.

19 dezembro 2008

Igreja e Culto – Parte 7

Alguns oficiais na Igreja Primitiva

Os termos “presbítero” (ou Ancião) ou “Bispo” (ou Supervisor, Superintendente) denotam no Novo Testamento o mesmo oficial, sendo que o primeiro deriva da sinagoga e o segundo das comunidades gregas; o primeiro significa a dignidade e o segundo, a tarefa.

1) A identidade destes oficias é evidente dos seguintes fatos:

A - Eles aparecem sempre como pluralidade ou como um colégio numa mesma congregação, mesmo em pequenas cidades como Filipos (Fp 1:1).
B – Os mesmos oficiais da Igreja de Éfeso são chamados de presbíteros e bispos alternadamente (At 20:17,18).
C – Paulo envia congratulações aos “bispos” e “diáconos” de Filipos, mas omite os presbíteros porque foram incluídos nos primeiro termo; assim indica o plural (Fp 1;1).
D – Nas epístolas pastorais, onde Paulo busca apresentar as qualificações para todos oficiais da Igreja, ele novamente menciona somente dois, bispos e diáconos, mas usa o termo presbítero depois de bispo (ITm 3:1-13, 5:17-19; Tt 1:5-7).
E – O intercâmbio de termos continuou a ser usado no final do primeiro século, como evidencia a epístola de Clemente de Roma (cerca de 95) e a “Didaquê”, e permaneceu até o final do segundo. (...)

2) A origem do ofício presbítero-episcopal não é relatada no Novo Testamento, mas quando ele é mencionado pela primeira vez na congregação de Jerusalém, 44 A.D., aparece sempre como uma instituição estabelecida. Assim como a sinagoga era dirigida por anciãos, de igual modo seria natural que cada congregação judeu-cristã adotasse de início esta forma de governo; talvez seja esta a razão do autor de Atos que julga desnecessário dar um relato da origem; no entanto, ele narra a origem do diaconato surgida de uma emergência especial que não tinha nenhuma analogia precisa na organização da sinagoga. As Igrejas gentílicas seguiram o exemplo, preferindo sempre o termo familiar “bispo”. A primeira coisa que Paulo e Barnabé fizeram na Ásia Menor foi organizar Igrejas pela escolha de anciãos (At 14:23; Tt 1:5).

3) O ofício de presbítero-bispo era ensinar e governar a congregação particular colocada sob sua responsabilidade. Eles eram os “pastores e mestres” regulares. A eles pertencia a direção do culto público, a administração da disciplina, o cuidado das almas e a gerência da propriedade da Igreja. Eram geralmente escolhidos entre os primeiros convertidos e indicados pelos apóstolos ou seus delegados, com a aprovação da congregação (ou pela própria mesmo), que os sustentavam pelas “contribuições voluntárias” (não é relatado no Novo Testamento a prática do “dízimo” pela Igreja primitiva). Eram introduzidos solenemente em seu ofício pelos apóstolos ou por outros presbíteros pela oração e imposição das mãos (At 14:23; Tt 1:5; I Tm 5:22, 4:14; II Tm 1:6).

4) Os anjos das 7 Igrejas da Ásia Menor podem ser vistos como idênticos aos presbíteros-bispos ou patores locais. Eles representavam os presbíteros presidentes ou o corpo dos oficiais regulares, como mensageiros responsáveis de Deus à congregação. Na morte de Paulo e Pedro, sob Nero, as congregações eram dirigidas por um colégio de anciãos. (...)

*Philip Schaff. History of the Chritian Church. Grand Rapids, Micj, Eerdmans, 1962. Vol. I, pp. 491-498.

16 dezembro 2008

Igreja e Culto – Parte 6


"A origem da Ceia"

(...) Até recentemente o conceito tradicional era que a Última Ceia fora a Páscoa, celebrada por nosso Senhor com seus discípulos pela última vez na noite de Sua traição. A evidência, porém, foi reexaminada. (...)

Uma nova proposta sustenta que a Última Ceia deriva de um simples refrigério, compartilhada semanalmente por pequenos grupos de homens judeus, geralmente por um rabino e seus discípulos. Seu propósito era prepará-los para o sábado ou para um festival e tinha um caráter religioso. Consistia numa prática religiosa seguida por uma refeição simples, de pão comum e vinho misturado com água, passando o copo um ao outro, e por orações. Esta refeição era conhecida como a “Kiddush” e se observava comumente em círculos piedosos de então, especialmente em círculos messiânicos. É quase seguro que nosso Senhor e seus discípulos estavam acostumados a participar desta refeição comunitária nas vésperas de cada sábado e festivais: assim, a “Última Ceia” foi à última delas que compartilharam.
Se a Páscoa tivesse começado na “noite em que foi traído”, nosso Senhor não teria podido ser julgado e executado neste mesmo dia, porque era contra a lei dos judeus celebrar um juízo ou uma execução durante a Páscoa. (...)

O caráter da Última Ceia era fundamente diferente da Páscoa. A Páscoa era um festival estritamente familiar; a “Kiddush” sempre era observada por um grupo de amigos homens. Durante a Páscoa se oferecia um cordeiro pascal; isto falta na Última Ceia, embora essencial para a Páscoa. Era necessário também pão sem levedo, mas na “kiddush” se usava sempre pão comum levedado; todos os relatos assinalam especificamente que na Última Ceia se comeu pão comum. Na Páscoa se usavam vários copos; na Última Ceia, como na “kiddush”, só houve um copo. Durante a Páscoa lia-se invariavelmente a passagem que narra o êxodo do Egito; não há menção alguma disto na Última Ceia.

(...) Desde o começo, a Ceia do Senhor foi celebrada com freqüência e uma celebração semanal logo se tornou prática aceita. A “Kiddush” também era celebrada semanalmente, mas a Páscoa só uma vez por ano. O costume subseqüente mostra claramente que os discípulos compreenderam das ações e palavras de nosso Senhor que deviam celebrar a eucaristia com freqüência; isto seria improvável se a Última Ceia tivesse sido a Páscoa anual e não a Kiddush semanal.
Ademais, o vinho do “kiddush” se misturava com água a moda oriental comum; e esta tem sido, exceto na Igreja Arminiana, a prática universal da Igreja ao celebrar a eucaristia.

*Willian D. Maxwell. El culto cristiano; su evolución y sus formas. Buenos Aires, Methopress, 1963. pp. 19-21.

09 dezembro 2008

Igreja e Culto – Parte 5


*Culto cristão*

O culto cristão na era apostólica

O culto cristão é a adoração pública ao Senhor Deus em nome de Cristo; a celebração da comunhão dos crentes como uma congregação com Seu Pai celestial, para a glória do Senhor e para a promoção e enriquecimento da vida espiritual. Embora se realize primariamente na devoção e edificação da igreja em si, o culto tem, ao mesmo tempo, um caráter missionário e abarca o mundo inteiro. Este foi o caso no Dia de Pentecostes quando o culto cristão, em seu caráter peculiar, primeiramente surgiu.

Assim como nosso Senhor mesmo em Sua juventude e humanidade cultuou na sinagoga e no templo, também seus discípulos o fizeram até quando foram tolerados. Mesmo Paulo pregou o Evangelho nas sinagogas de Damasco, Chipre, Antioquia da Psídia, Anfépolis, Beréia, Atenas, Corinto e Éfeso. Ele “disputou com os judeus todo sábado na sinagoga”, que ele propiciava um púlpito e uma platéia.

Os judeus cristãos, pelo menos os da Palestina, conformaram-se, dentro do possível, às formas antigas do culto de seus pais, que, na verdade, eram divinamente inspiradas e constituíam um modo expressivo de culto cristão. Até quando podemos saber, eles observaram escrupulosamente o sábado, as festas judaicas anuais, as horas de oração diária e todo ritual mosaico; e celebraram, em acréscimo, o domingo cristão, a morte e ressurreição do Senhor e a santa Ceia. Mas esta união foi gradualmente enfraquecida pela obstinada oposição dos judeus e foi finalmente quebrada por completo pela destruição do templo, exceto entre os ebionitas e nazarenos.

Nas congregações gentílico-cristãs fundadas por Paulo, o culto tomou desde o começo uma forma mais independente. Os elementos essências do culto vétero-testamentário foram transpostos, é verdade, mas despidos do seu caráter legal nacionalista e transformados pelo espírito do Evangelho. Assim, o sábado judaico tornou-se o domingo cristão; a Páscoa e o Pentecostes tornaram-se as festas da morte e ressurreição de Cristo e da efusão do Espírito Santo; os sacrifícios sanguinolentos deram lugar à recordação agradecida, à apropriação do sacrifício todo-suficiente e eterno na cruz e à oferta pessoal de oração, intercessão e total consagração ao serviço do Redentor; das ruínas do templo, surgiu o culto (sem fim temporal) do Deus onipresente em espírito e em verdade.

As Várias partes do culto

As várias partes do culto público ao templo dos apóstolos eram as seguintes:

1. A PREGAÇÃO DO EVANGELHO

A pregação aparece no primeiro período principalmente na forma de uma mensagem missionária aos inconversos; é uma apresentação simples e viva dos principais fatos da vida de Jesus, com exortação prática ao arrependimento e à conversão. Cristo crucificado e ressuscitado era o centro iluminador, cuja luz santificadora permearia todas as relações da vida. (...) Deste testemunho cristão primitivo vários exemplos de Pedro e Paulo são preservados nos Atos dos Apóstolos.

2. EXPOSIÇÃO DAS ESCRITURAS SAGRADAS

A leitura das porções do Velho Testamento, com exposição e aplicação prática, foi transferida da sinagoga judaica para a Igreja cristã (At 3:15; 15:21). A esta foram acrescidas, em tempo próprio, as lições do Novo Testamento (...). Após a morte dos apóstolos, seus escritos tornaram-se duplamente importantes para a Igreja, como substitutos para a instrução oral e exortação, e foram muito mais usados no culto do que o Velho Testamento.

3. ORAÇÃO

Em suas várias formas de petição, intercessão e gratidão. Isto veio de igual modo do judaísmo e, na verdade, pertence essencialmente a todas as religiões pagãs; agora, porém, começou a ser oferecida, em confiança pura num Pai mediado pelo nome de Jesus, a todas as classes e condições, mesmo aos inimigos e perseguidores. Os primeiros cristãos acompanhavam cada ato importante de sua vida pública e particular com este rito santo. Paulo, por exemplo, exorta seus leitores a que orem sem cessar. Em ocasiões solenes, eles participavam do jejum com oração, como ajuda à devoção, embora isto não esteja claramente estabelecido no Novo Testamento (Mt 9:15; At 13:3; 14:23; I Co 7:5). Eles oravam na liberdade do coração, como movidos pelo Espírito, de acordo com as necessidades e circunstâncias. (...) Não há nenhum traço de liturgia uniforme e exclusiva; isto seria incongruente com a vitalidade e liberdade das Igrejas apostólicas. Ao mesmo tempo, o uso freqüente de salmos e pequenas formas de devoção, como a Oração do Pai Nosso, pode ser inferida, certamente, como decorrente do costume judaico; da direção do Senhor em relação a sua oração modelo; do forte sentido de comunhão entre os primeiros cristãos e, finalmente, do espírito litúrgico da igreja antiga, que não prevaleceria no oriente e no ocidente sem o precedente apostólico. As formas mais antigas são as orações eucarísticas do “Didaquê” e a petição pelos governantes na primeira Epístola de Clemente, que contrasta visivelmente com a hostilidade cruel de Nero e Domiciano.

4. O CÂNTICO

Uma forma de oração, como adorno festivo da poesia e elevada linguagem da inspiração, levava a congregação aos altos cumes da devoção e tomava parte nas harmonias celestiais dos santos. Isto passou imediatamente, junto com os salmos do Velho Testamento, foram tesouros inesgotáveis de experiência espiritual, edificação e conforto do templo e da sinagoga para a igreja cristã. O próprio Senhor inaugurou a salmódia no novo concerto ao instituir a Santa Ceia (MT 26:30; MC 14:26 ) e Paulo expressamente exortou ao canto de “salmos e hinos espirituais ”, como meio de edificação social. Mas a esta herança preciosa do passado, cujo valor pleno foi agora pela primeira vez compreendido à luz da revelação novi-testamentária, a igreja, no entusiasmo do seu primeiro amor, acrescentou salmos, hinos, doxologias e bênçãos original e especificamente cristãos, que propiciaram o riquíssimo material para a poesia sacra dos séculos seguintes.
Acrescentou ainda: o cântico das hostes celestiais, como por exemplo, no nascimento do Salvador, o “nunc dimittis” de Simão, o “Magnificat” de Maria; a “Benção” de Zacarias; o agradecimento de Pedro após sua libertação miraculosa ; o falar em línguas na igreja apostólica que, seja oração ou cântico, era sempre uma linguagem elevada de entusiasmo; os fragmentos de hinos espalhados pelas epístolas, e as passagens líricas e litúrgicas, como as doxologias e antifonias do Apocalipse.

5. A CONFISSÃO DE FÉ

Todos os atos de culto mencionados acima são atos de fé. A primeira confissão expressão de fé é o testemunho de Pedro de que Jesus era o Cristo, o Filho do Deus vivo. O seguinte é a formula batismal trinitariana. Além destes, começou a se formar o chamado Credo dos Apostólos, que também é trinitariano em sua estrutura, mas que dá à confissão do Cristo o lugar central e mais importante. (...)

6. SACRAMENTOS

Finalmente, a administração dos sacramentos, ou ritos sacros instituídos por Cristo, através dos quais, símbolos próprios e sinais visíveis, dons espirituais e graça invisível são representados, selados e aplicados aos participantes dignos.

*Philip Schaff.History of the christian church. Grand Rapids, Mich., Eerdmans, 1962. Vol. I, pp.460-465.

02 dezembro 2008

Igreja e Culto – Parte 4

..."Liberdade de espírito e disciplina litúrgica"...

(...) O valor dos cultos cristãos mais antigos estava em coordenar harmonicamente a liberdade espiritual e a disciplina litúrgica para o alvo da “edificação” da Igreja. Indubitavelmente, existia desde o princípio o perigo duplo de apagar o Espírito ou de aceitar cegamente toda manifestação que pretendesse passar por sua. Era requerido um alto sentido de valor e ordem, para se manter o equilíbrio entre elementos tão dispares como a glossolalia e a profecia, de uma parte, e os atos e as fórmulas litúrgicas estabelecidas, de outra. (...) Esta síntese harmoniosa de liberdade e de disciplina é o que constitui a grandeza do culto primitivo e o que lhe confere seu caráter peculiar. Paulo tinha constantemente presente esta “edificação” da Igreja como corpo de Cristo; por isto, não caiu no erro de reduzir a um mínimo a vida litúrgica por temor ao formalismo, nem no de desterrar, de pronto, todas as manifestações espontâneas do Espírito por temer o sectarismo. Se a Igreja houvesse ficado fiel a essa linha de conduta, teria impedido eficazmente o nascimento de seitas e facções.

Oscar Cullmann. La fé y el culto em la Iglesia primitiva. Madrid, Studium, 1971. pp.175s.

Perguntas: * participação democrática dos membros de uma Igreja nos cultos modernos?
*O formalismo litúrgico contemporâneo dá liberdade ao Espírito para atuar nas almas famintas?

Esta tese abaixo é de Arthur Alexandre Costa Pereira – Pastor e Bacharel em Teologia. O Arthur foi meu professor de Introdução Bíblica no seminário Ceforte em Petrópolis/RJ.

Não extinguir o Espírito (I Ts 5:19).

O termo extinguir tem vários sentidos, entre eles, sufocar, apagar, limitar. Esse sufocamento tem dois níveis. O nível congregacional e o nível individual. O sufocamento em nível congregacional é promovido por aquele que dirige o culto. Existe uma herança litúrgica romana muito forte dentro da igreja de Cristo, a partir da fusão da Igreja com o Estado em 313 a.D. Os cultos na igreja primitiva eram espontâneos. Um tinha salmo, outro doutrina, outro revelação, profecia, cântico espiritual, etc. A partir da referida data, o culto passou de espontâneo a litúrgico. Uma metodologia engessada foi introduzida e os cultos foram se tornando frios até chegarem ao que hoje conhecemos por missa. O culto passou a ser fruto da mente e não algo gerado pelo Espírito de Deus. Quando o Espírito Santo consegue aquecer a igreja e esta começa a responder à Presença de Deus com adoração, línguas e orações espontâneas, o dirigente diz: “Amém; amém. Aleluia, amém”. Na verdade, o que ele está falando é: Espírito Santo fique quieto, afinal, está na hora da mensagem, que por sua vez, também costuma ser fruto do treinamento. A noiva é arrancada violentamente dos braços do Noivo em nome do programa a ser seguido. A prédica é perfeita! Os recursos homiléticos e hermenêuticos garantem a precisão exegética e expositiva da mensagem, só não conseguem produzir a unção necessária para satisfazer as almas famintas. Que pregação nossa pode substituir o que o Espírito Santo está fazendo?

A extinção do Espírito nesse nível é um câncer tão severo que em 24 de Agosto de 1662, dois mil ministros puritanos foram excluídos dos seus púlpitos pelo Ato de Uniformidade, baixado pelo Parlamento inglês, conhecido pelos evangélicos como A Grande Ejeção. A religião oficial era a Igreja Anglicana, e forçava os puritanos a se moldarem à adoração litúrgica decretada por lei. Eles preferiram o silêncio à transigência.

O sufocamento em nível individual é o fruto do sufocamento em nível coletivo. O novo crente não é ensinado a andar no Espírito. Ensinam a ele como a denominação funciona, e não como o reino de Deus funciona. Quando é tocado particularmente pelo Espírito no banco, ou no púlpito, se sente inibido, afinal, se eu levantar as mãos e começar a adorar a Deus fora do período de louvor ou se sentir vontade de me prostrar ao Senhor no corredor no meio da mensagem, o que as pessoas vão falar de mim? Se eu começar a dançar perante a Arca, Mical pode me reprovar (II Sm 6).

Alguém vai contra argumentar dizendo que o culto precisa ter ordem. Eu concordo. Nosso Deus é um Deus ordeiro, mas quando Paulo fala da ordem do culto em I Co 14, ele não está falando de liturgia. Ordem e liturgia são duas coisas diferentes. A liturgia está fora da ordem de Deus.

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