31 dezembro 2007

Feliz 2008!!!

"Que a fé e a esperança num futuro melhor sejam revividas a cada dia no seu coração."

Um abraço!!!
Eduardo Neves.

30 dezembro 2007

Cristo morto ou ressuscitado?

Para muitos, a cruz passou a ser o centro da história. Sem ela, nada na vida tem significado. Seu simbolismo remete diretamente à salvação.

A salvação de todos, através do trabalho missionário e evangelístico, tem sido o objetivo de muitas denominações evangélicas. A abordagem do trabalho na Igreja tem sido, em sua grande maioria, tirar o pecador do lamaçal do pecado. Depois de convertido, o novo crente logo aprende que também deve se engajar nessa tarefa árdua de levar outros a Cristo, para que, depois de convertidos, possam estes também levar outros aos pés do Senhor, e assim por diante.

Nada de errado há, claro, com a necessidade da pregação do Evangelho e do trabalho missionário. A questão é que, quando focamos apenas a cruz e tão somente a evangelização como obra central da Igreja, deixamos de lado o que é mais importante – a vitória de Jesus Cristo pela ressurreição. Um Cristo morto é como qualquer outro líder religioso também morto, mas não ressuscitado. Um Cristo morto é apenas ignomínia, desprezo, maldição – ele se fez maldição por nós.Se enfatizarmos apenas a cruz e a salvação, corremos o grave risco de pregarmos um evangelho antropocêntrico, que só interessa ao homem. Seria como focalizar o presente ao liberar o homem de suas angústias materiais ou apenas alimentar o desejo humano de evitar o inferno.

A ressurreição é tão importante que Cristo é declarado Filho de Deus por meio dela. A cruz foi importante; sem ela, não haveria perdão de pecados. Mas o que dá significado ao Evangelho é a obra completa que se realizou pela ressurreição. Portanto, a pedra removida do sepulcro é o centro da história humana, e não a cruz. Sem a ressurreição, nossa fé seria vã, disse o apóstolo Paulo, que também mostrou que assim como fomos crucificados com Cristo, devemos ser com ele ressuscitados em novidade de vida.Ser salvo requer apenas o exercício do arrependimento e da fé. Mas prosseguir para assumir uma nova vida, uma vida ressuscitada, requer abnegação incondicional a cada momento. Isso é centenas de vezes indesejável – afinal, quem desejaria abandonar sua vontade, suas aspirações, seus bens e direitos, e diariamente entregá-los no altar de Jesus, conforme Romanos 12.1?

O Evangelho da cruz é mais fácil. Mas Jesus não ficou no túmulo. Será que ainda vale a pena continuar no túmulo de nossa vida?

Lourenço Stelio Regaé teologo, educador e escritor.

12 dezembro 2007

A contemplação do belo

Vivemos numa sociedade tecnológica que valoriza mais a ação e a funcionalidade do que a contemplação. Ao reverter estes valores, terminamos por exaltar a produtividade, dando ao homem a prerrogativa de ser ele o agente que fabrica a realidade a partir das ferramentas tecnológicas que possui. O meio e o fim são invertidos e a vida passa a ser medida pelo sucesso, desempenho e eficiência. Somos constantemente desafiados a ter vida, ministério, trabalho, família, lazer ou sexo com propósito – tudo muito pragmático e funcional. A quantidade de livros com as famosas receitas de “como” enchem nossas livrarias: “Como ter uma família saudável”,Como obter o melhor de Deus” ou “Como desenvolver um ministério eficaz”, reduzindo a vida a esquemas produtivos. É a nova mentalidade tecnológica transformando as complexidades humanas e espirituais em pequenos defeitos que podem ser consertados com o uso correto de um bom manual e das ferramentas que ele sugere. A felicidade e a realização estão no resultado.


A beleza está no produto final, e não no que é simplesmente belo. Uma das grandes perdas que temos sofrido com a alta tecnologia da sociedade pós-moderna e a obsessão pelo sucesso é a da percepção da beleza. Valorizamos cada vez mais a eficiência e cada vez menos a arte. Preferimos o fast food, e não mais saborear uma boa refeição. Substituímos o real e o natural pelo virtual e pelo plástico. Vivemos como um turista que leva nas viagens suas câmeras e filmadoras digitais para não perder tempo contemplando a beleza da arte ou da criação. A aparência nos impressiona mais do que a realidade. Dentro de nossas igrejas, o efeito da mentalidade tecnológica é sutil e devastador. Imaginamos que se temos uma boa liturgia, boa música e coreografia, teremos um bom louvor e uma boa adoração. Se temos um programa eficiente, teremos um bom e fiel ministério. Se temos um bom sistema de integração de visitantes, teremos uma boa comunhão. A tecnologia nos afasta do belo e o reduz a um programa que nos ilude e nos leva a pensar que a beleza está na eficiência do produto e não mais no olhar, no gesto de fé e coragem, na criatividade ou num simples sorriso. A incapacidade de perceber a beleza é um dos sinais mais evidentes de que temos perdido nossa relação pessoal com Deus. Falamos mais sobre a utilidade da obra da cruz e menos da beleza do crucificado. Somos mais atraídos pela funcionalidade da igreja e por suas atividades do que pela beleza da comunhão de amor e amizade entre os santos. Somos cada vez mais seduzidos pelos encantos de uma vida bem sucedida do que pela beleza da santidade. No entanto, a alma humana anseia pelo que é belo. Anseia pela harmonia da criação, pela nobreza da vida em comunhão, pela pureza do amor, pela glória da ressurreição, pelas realidades não visíveis. É a beleza que sustenta o coração em meio à dor e ao desespero. Santo Agostinho fez esta pergunta: “Podemos amar outra coisa senão a beleza?” Quando olhamos para a lista que o apóstolo Paulo nos apresenta das obras da carne, vemos ali um conjunto assimétrico, sem harmonia e beleza. São expressões que descrevem as formas mais bizarras de egoísmo, exploração, mutilação e destruição. Mas quando ele abre a lista do fruto do Espírito, vemos uma relação simétrica, harmoniosa e bela que nos atrai para Deus e o próximo. As “bem aventuranças” também são belas pela sua harmonia. A cultura moderna valoriza mais as obras da carne como expressões de realização e liberdade, do que o fruto do Espírito. Isso revela o grau de alienação em que vivemos. O livro do Cântico dos Cânticos é um convite à contemplação da beleza e da harmonia: “Como você é linda, minha querida! Ah, como é linda!”; ou “Como você é belo, meu amado! Ah, como é encantador!” A beleza contemplada em Cantares não é apenas estética. Ali, o belo é a harmonia de tudo o que existe dentro e fora, e de tudo o que envolve Deus e sua criação. O belo existe para ser contemplado. Não é sua utilidade ou propósito que nos atrai, mas sua beleza e harmonia. Ele pode até ser útil, mas não é isso que nos fascina. O belo não precisa ser útil para ser belo. O salmista nos convida para “adorar a Deus na beleza da sua santidade”. O ser Santo de Deus nos atrai porque revela a harmonia de todos os seus atributos (amor, justiça, misericórdia, bondade, poder etc) e a harmonia em toda a sua criação – “Viu Deus que tudo era muito bom”, conforme o Gênesis. Santo Agostinho em suas confissões, diz:

“Que amo eu, quando vos amo? Não amo a formosura corporal, nem a glória temporal, nem a claridade da luz, tão meiga destes meus olhos, nem as doces melodias das canções de todo o gênero, nem o suave cheiro das flores, dos perfumes ou dos aromas, nem o maná ou o mel, nem os membros tão flexíveis aos abraços da carne. Nada disso amo, quando amo meu Deus. E contudo, amo uma luz, uma voz, um perfume, um alimento e um abraço, quando amo meu Deus; brilha para a minha alma uma luz que nenhum espaço contém, onde ressoa uma voz que o tempo não arrebata, onde se exala um perfume que o vento não esparge, onde se saboreia uma comida que a sofreguidão não diminui, onde se sente um contato que a saciedade não desfaz. Eis o que amo, quando amo meu Deus”.


Para Agostinho, seu encontro com Deus trouxe de volta a harmonia e a beleza. Para ele, amar a Deus envolve, entre outras coisas, romper com o caos, recuperar os sentidos, olhar em volta e perceber a graça e a bondade de Deus na luz do sol, na escuridão da noite, na ingenuidade infantil e nas tribulações da vida. Precisamos recuperar a contemplação e o belo numa cultura pragmática e fortemente determinada pelas forças do mercado. Precisamos resistir à pressão pela produtividade. Precisamos voltar a entrar na igreja simplesmente para adorar a Deus na beleza de sua santidade e reconhecer: “Que magníficas são, Senhor, as tuas obras! Quão profundos são os teus pensamentos!” Precisamos voltar a reconhecer a harmonia e a grandeza da criação e da obra de Cristo e celebrar a beleza da presença de Deus na vida e na história, para que a oração recupere seu significado.

Ricardo Barbosa de Souzaé conferencista e pastor da Igreja Presbiteriana do Planalto, em Brasilia